Enquanto as pegadas se acumulavam apressadas a me perseguir sobre a areia da praia, o suor me assediava o corpo inteiro. Ofegante, reduzi o ritmo da corrida e estabeleci como meta uma jangada atracada alguns metros adiante. Até me apressei ao chegar mais próximo dela, como que para saldar de vez minha dívida usando a energia que precisaria liberar em troca daquele objetivo. Consegui chegar, mas, por alguma razão, decidi continuar o treino. Segui pisoteando a areia hostil que sugava meus passos. Furei-a em pisadas desafiadoras enquanto incontáveis gotas de suor me abandonavam desistentes no meio do caminho.
Sob o sol ultrajante da Praia do Futuro às onze da manhã, cada passo era uma volta ao mundo. O percurso me roubava o ar e todo esforço ameaçava ser o último. Com a respiração sôfrega e as pernas bambas de tão lento que o cansaço me tornou, percebi que estava sendo ultrapassado pelas minhas próprias pegadas, lideradas pela minha própria sombra. Podia ouvi-las no meu encalço, se aproximando e por fim passando esnobes por mim, me atropelando como ao mais insignificante retardatário enquanto o sol me chicoteava como a um esqueleto de carga. Mas ao avistar o fracasso acenando e sorrindo para mim do horizonte trêmulo, somente a obstinação, a paixão e esses tantos outros oxigênios que nos tiram o fôlego poderiam me proteger do constrangimento pessoal de desistir antes de recuperar minha sombra.
Eu já não era o mesmo, sabia. Mas ainda era eu mesmo. Afinal, o que somos é a única coisa da qual não podemos correr, é o que ainda permanece quando nem mesmo nossas pegadas estão dispostas a nos seguir. Algumas voltas ao mundo depois, alcancei minha sombra e ultrapassei minhas pegadas. As que ficaram para trás o mar lambeu e levou. Desde então, são partes de mim a caminhar no fundo do oceano.