"Mãe, olha pro céu", disse o garoto enquanto se sentava no encosto do velho banco de madeira da praça. Já pressentindo a repreensão por seus modos feios, que veio na forma de um breve "Senta direito", ele não chegou sequer a ensaiar apoiar os pés no assento, conforme planejara. "Tá, mas olha pro céu", insistiu mesmo destituído de seu conforto incompreendido.
Ao perceber a cabeça de sua mãe inclinada, continuou. "Tem um monte, né? De estrela? Hoje ouvi o cara da televisão dizer que cada uma sai do seu planeta e vem se encontrar com as outras no céu, é verdade?". Ainda com a cabeça para trás, a mãe reage ao depoimento do cara da televisão com um demorado "É mesmo?". "É mesmo. Algumas vêm de pertinho, outras de longe. Por isso que aquela ali ainda tá bem brilhante, ela não precisou viajar muito. Mas tá vendo aquela outra, ali embaixo? Tá tão cansada da viagem que nem brilha direito mais. Com certeza veio de muito, muito longe".
"E o que é que elas vêm fazer no céu?", a mãe perguntou enquanto baixava novamente a cabeça para apoiá-la sobre uma das mãos, agora olhando para o filho. "Ele não disse, mas acho que elas vão porque acham legal lá. E porque podem. Eu queria ir também, mas não posso porque não sei voar ainda", o garoto explicou enquanto saltava para mais uma tentativa de sentar no encosto e pisar no assento. Dessa vez, a reação da mãe se limitou a levantar novamente a cabeça, mas com o simples objetivo de acompanhar seu filho com o olhar. "Mas no planeta delas não tem céu?", perguntou. "Não, mãe! Os planetas ficam no céu, senão eles ficariam onde? Debaixo da terra?", o filho respondeu impaciente.
"É, é. tem razão!", confessou a mãe com o desdém respeitoso que se dispensa à ingenuidade amparada na lógica. E arriscou: "Mas essas estrelas devem gostar mesmo é de mato. Tem sempre um montão no céu das cidadezinhas do interior, já viu?". "Já, e acho que é porque o trânsito pra lá é menos engarrafado. Aí só algumas vêm pro céu da cidade grande".
As sobrancelhas exageradamente franzidas da mãe combinadas com a boca entortada que formava uma cova no canto do rosto compuseram o cenário perfeito para seu "Faz sentido" proferido durante um também exagerado gesto de aquiescência. E perguntou: "E o Sol também é uma estrela. O cara da televisão te contou isso também?".
"Contou que é a maior de todas elas. E de tão grande que é, só pode ir pro céu sozinho, senão engarrafa tudo até no interior!"
6 comentários:
"Ele não disse, mas acho que elas vão porque acham legal lá. E porque podem. Eu queria ir também, mas não posso porque não sei voar ainda."
Eu acharia a coisa mais linda do mundo um filho meu dizer uma coisa dessas, não estivesse ele sentado com os pés na bancada. Senta direito, moleque - tabefo!
"Já, e acho que é porque o trânsito pra lá é menos engarrafado. Aí só algumas vêm pro céu da cidade grande".
Vou começar a fazer corridas intergalácticas. Vai acabar me rendendo mais.
-nztixhzd-
Ei, vou linkar tu lá no Verdes e Fritos dia 31, tá?! É o Blog Day...
As regras tão aqui:
http://www.blogday.org/pt.htm
Beijo, Lennon!
-xoqtcskj-
Enfim, consegui um tempo para ler este.
E, não poderia ter outra surpresa: esse é lindinho demaaaaais.
Sabe que, tenho sempre que ter um tempo para ler teus textos, não posso fazer uma leitura ligeirinha, somente por fazer, só para comparecer, não, não pode ser assim fugaz. Simplesmente pq teu texto me atrai, me comove, e quando arranjo um tempo para ler, estou quase sempre preparada para sentir.
Esse, tão singelo que é suscitou em mim o riso, a lembrança da infância e o desejo maternal.
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